Primeiramente é preciso entender o que é o perdão judicial e quais são os casos em que é possível sua aplicação. Segundo leciona Rogerio Greco (2013, p. 712):


"...O perdão judicial não se dirige a toda e qualquer infração penal, mas sim, àquelas previamente determinadas pela lei. Assim, não cabe ao julgador aplicar o perdão judicial nas hipóteses em que bem entender, mas tão somente nos casos predeterminados pela lei penal."

No Código Penal o instituto do perdão judicial está previsto nos artigos 121, § 5º e 129, § 8º, que tratam, respectivamente, do homicídio culposo e da lesão corporal culposa. Vejamos:

"Art. 121, § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária."

Ou seja, quando o perdão judicial estiver previsto expressamente na legislação ocorrerá a extinção da punibilidade que está prevista no art. 107 do Código Penal, in verbis:

"Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;
VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei."

O instituto da Punibilidade constitui a capacidade do Estado exercer seu "jus puniendi", que consiste na capacidade de punir o particular quando desrespeitar a norma penal. Mais uma vez convém mencionar Rogerio Greco (2015, p. 699):

"A punibilidade é uma consequência da prática de uma conduta típica, ilícita e culpável levada a efeito pelo agente. Toda vez que o agente pratica uma infração penal, isto é, toda vez que infringe o nosso direito penal objetivo, abre-se a possibilidade para o Estado de fazer valer o seu jus puniendi."

Neste contexto, percebe-se que o perdão judicial só pode ser aplicado com previsão expressa em lei, ficando a dúvida quanto à sua aplicação nos casos de crimes de trânsito de homicídio culposo (art. 302 do CTB) e lesão corporal culposa (art. 303 do CTB).

É importante frisar que o perdão judicial estava previsto expressamente no projeto de lei que disciplinou o Código de Trânsito Brasileiro, especificamente em seu art. 300 que sofreu veto presidencial. Vejamos sua redação original:

"Art. 300. Nas hipóteses de homicídio culposo e lesão corporal culposa, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem, exclusivamente, o cônjuge ou companheiro, ascendente, descendente, irmão ou afim em linha reta, do condutor do veiculo."


Razões do veto:
"O artigo trata do perdão judicial, já consagrado pelo Direito Penal. Deve ser vetado, porém, porque as hipóteses previstas pelo § 5° do art. 121 e § 8° do artigo 129 do Código Penal disciplinam o instituto de forma mais abrangente."


Embora as razões do veto sejam bastante criticadas por parte da doutrina, como Campos Pires e Sheila Selim (1998, p. 186 apud GRECO, 2013, p. 715) que disciplinam:


"Embora justificáveis as razões do veto, parece-nos, com efeito, que de melhor técnica seria prever expressamente tais hipóteses no Código de Trânsito, ampliando-as como necessárias. O legislador não o fez. Ainda assim, as hipóteses de perdão judicial previstas para o homicídio culposo e a lesão corporal culposa, no Código Penal, devem ser aplicadas aos arts. 302 e 303 do Código de Trânsito, seja porque o art. 291 envia o interpreta à aplicação das normas gerais do Código Penal, seja por força das razões do veto antes expostas, que se referem expressamente àquelas hipóteses."


Neste diapasão, Damásio de Jesus (2009, p. 60) defende:


"o perdão judicial é admissível nos crimes de homicídio culposo e lesão corporal culposa cometidos no trânsito. O obstáculo do veto é superável. No Projeto de Lei, o instituto só era admitido em determinados casos, restrição com que não concordou o Senhor Presidente da República. Por isso impugnou o dispositivo, não sem antes dizer da conveniência da medida nos delitos de circulação."


Vale salientar que embora o art. 291, caput, do CTB estabeleça a aplicação das normais gerais do Código Penal, quando o capítulo que trata dos crimes de trânsito não dispuser de modo diverso, estando o perdão judicial previsto na Parte Especial do Código penal, poderia mesmo assim o instituto ser aplicado no CTB?


Respondendo a esse questionamento, Damásio aduz (2009, p. 60):


"Não são convincentes as teses de que ao CT, por força de seu art. 291, caput, somente são aplicáveis as 'normas gerais' do Código Penal, encontrando-se o perdão judicial na Parte Especial, e que esse instituto só é admissível 'nos casos previstos em lei', silenciando a Lei n. 9.503/97 sobre o tema."


Para Greco (2013, p. 717):


"... acreditamos junto com a corrente majoritária, ser possível, por questões de politica criminal, a aplicação do perdão judicial aos arts. 302 e 303 do Código Penal."


Com base no que foi exposto, podemos concluir ser perfeitamente possível a aplicação do perdão judicial nos Crimes de Trânsito dos artigos 302 e 303 do CTB. Entretanto, o ideal seria constar expressamente no Código de Trânsito Brasileiro tal previsão, assim como defende Greco (2013, p. 717).



Por: Guilherme Araujo - Bacharel em Direito, Pós-graduando em Normatização de Trânsito, Transporte e Direito Administrativo.

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