Especialistas analisam ação contra ‘delações’ de blitz no Twitter

Após a Advocacia-Geral da União (AGU) entrar com uma Ação Civil Pública na Justiça Federal de Goiás contra o Twitter INC e os titulares das contas que alertam motoristas sobre o local e o horário das blitze de trânsito realizadas no Estado, alguns usuários da rede social começaram a debater o assunto, questionando a liberdade de expressão garantida pela Constituição.

Sobre a legitimidade da ação da AGU, o Terra conversou com especialistas em direito, que foram unânimes em validar a decisão. De acordo com o presidente do conselho da Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo (Acrimesp), Ademar Gomes, a decisão da AGU é correta.

“Existe legitimidade nessa ação e ela será julgada procedente. Alertar sobre a existência de fiscalização policial é apologia ao crime e ninguém pode fazer publicidade ao crime”, disse Ademar Gomes, que também culpou a empresa que administra o Twitter pelas mensagens: “O Twitter está sendo coautor de apologia ao crime. A liberdade de expressão tem limites e nós temos que colocar limites”, concluiu.

A opinião é compartilhada pelo professor de Direito Constitucional do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), Eduardo Mendonça. Segundo o professor, que é especialista em liberdade de expressão, o direito de se comunicar também precisa de limites. “A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas ela não é ilimitada. Portanto, eu não acho que a liberdade de expressão proteja esse tipo de manifestação”, disse.

Por outro lado, Mendonça acredita que as leis atuais possam ser melhoradas para enquadrar este tipo de divulgação. “Eu acho que não existe um tipo penal específico que enquadre esse tipo de conduta. Dos que foram citados na ação da AGU, o que mais se aproxima é o artigo 265 do Código Penal”, falou.

O artigo 265, citado pelo professor, diz que é proibido “atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água, luz, força ou calor, ou qualquer outro de utilidade pública”, ou seja, quem publicar a localização de uma blitz estará prejudicando um serviço de utilidade pública, o que renderia o período de reclusão de um a cinco anos e pagamento de multa.

Porém, segundo Mendonça, a fiscalização poderá encontrar dificuldades em enquadrar determinadas publicações no artigo citado, já que os próprios perfis se defendem dizendo que não estão estimulando a fuga das blitze e sim alertando a localização das barreiras policiais, para que os motoristas possam saber onde encontrar segurança. A maioria dos perfis citados ainda alegam que não falam apenas de blitz, e sim da situação do trânsito e pontos de alagamentos.

Reação dos usuários
O Terra teve acesso à ação protocolada pela AGU e verificou que a entidade acusa a administradora e os perfis RadarBlitzGO (@radarblitzgo), Blitzgyn (@blitzgyn) e Lei seca gyn (@leisecagoiania) de usarem a ferramenta para alertar motoristas. Contra os réus, a AGU solicita a fixação de multa diária de R$ 500 mil em caso de descumprimento da liminar.

Logo após a publicação da decisão, administradores de perfis semelhantes se manifestaram. O perfil RadarBlitzGO decidiu de imediato cessar as publicações. “@radarblitzgo: Em face da ação civil pública proposta pela AGU em Goiás contra a divulgação de informação sobre o trânsito, estamos suspendendo as atualizações até que a justiça se pronuncie”, disse. Em sua última publicação, no dia 7 de fevereiro, o perfil Blitzgyn alegou ainda estar ativo. Porém, há dois dias o perfil não publica nenhuma atualização. Já o terceiro réu, o administrador do perfil Lei seca gyn, não atualiza o perfil desde março de 2010.

O maior perfil que publica esse tipo de conteúdo em São Paulo também se manifestou sobre a decisão da AGU, classificando o ato como um atentado contra a liberdade de expressão. “@LeiSecaSP: A Constituição garante o direito irrestrito de comunicação: O que é o perfil LeiSecaSP a não ser cidadãos exercendo o direito de comunicação?” – questiona o perfil Lei Seca SP, que tem mais de 43 mil seguidores. Em outra publicação, o perfil interage com um representante carioca sobre os eventuais benefícios dos alertas: “@LeiSecaSP: Ao informar onde tem blitz ajudamos a população a saber onde pode encontrar a ajuda da PM! Certo, @LeiSecaRJ?”, questiona. O perfil do Rio de Janeiro tem mais de 280 mil seguidores.

Fiscalização
De acordo com a especialista em análise de mídias sociais, Natália Pellizzon, já existem ferramentas capazes de fazer uma varredura nas redes sociais e coletar postagens de alerta sobre blitze, porém, elas podem ficar limitadas em perfis configurados como privados. “As ferramentas conseguem coletar palavras-chave sobre determinados assuntos, desde que as contas do Twitter ou Facebook estejam marcadas como ‘públicas’”, disse.

De acordo com a especialista, rastrear os comentários de cada usuário das mídias sociais exigiria a criação de uma equipe que fosse capaz de filtrar as postagens e gerar relatórios. Como o aumento do número de adeptos às redes sociais no Brasil, esse trabalho seria cada vez mais complicado. “O volume de informação é muito grande, e muitas vezes aparecem comentários que são filtrados e não correspondem ao assunto de interesse”, finalizou.

Por enquanto, a decisão da AGU atinge somente o Estado de Goiás. A ação, que foi protocolada na Justiça Federal, ainda será analisada.

  Terra Brasil

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