Projeto do TJRN que transforma detentos em escritores vence Prêmio Innovare 2025


Quando a literatura atravessa grades: projeto potiguar vence prêmio nacional e mostra que história também nasce no cárcere

Algumas histórias começam em cafés, outras em editoras badaladas. Mas há também aquelas que nascem em lugares improváveis, como dentro de uma cela. É justamente desse cenário que surge o projeto Escritores e Escritoras do Cárcere, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, que nesta quarta (3) conquistou o Prêmio Innovare, na categoria Juiz, em cerimônia no Supremo Tribunal Federal, em Brasília.

Criado em 2012, o projeto transformou o sistema prisional potiguar em um inesperado celeiro de autores e autoras. O que começou como um incentivo à leitura e à escrita virou um movimento literário potente: já são mais de 20 obras acompanhadas, algumas publicadas, outras rodando clubes de leitura, e várias ganhando resenhas país afora. Tem ex-detento que virou best-seller, tem escritora que entrou para a Academia Brasileira de Letras do Cárcere, e tem gente que descobriu na palavra uma nova chance de existir.

O juiz Fábio Wellington Ataíde Alves e a servidora Guiomar Veras, que comandam a iniciativa, já acumularam histórias suficientes para montar uma antologia à parte. Fábio resume o impacto com uma frase que daria título de livro: “Eles estão escrevendo as próprias vidas, e reescrevendo suas trajetórias”. Guiomar completa: “A literatura resgata esperança onde tudo parece adversidade”.

E isso aparece na prática. Os participantes escrevem contos, cartas, crônicas, poemas e relatos autobiográficos. Cada texto pode gerar remição de pena, desde que passe por tutoria, avaliação interdisciplinar e a caneta final do juiz. A metodologia mistura escrevivência de Conceição Evaristo, literatura marginal, Paulo Freire e práticas restaurativas. É uma espécie de oficina literária em ambiente de concreto, onde a palavra vira janela.

Entre os autores revelados estão nomes como Amanda Karoline, de De Tambaba à Prisão; Newton Albuquerque, de A Escolha Errada; Carlos Romeu, de Poesia Livre; além de Dalvanete Alves, Jefferson Andrielle e Lucas Barbosa. Cada um com sua história, cada um reinventando o próprio enredo.

A cerimônia do dia 3/12, em Brasília, reuniu magistrados, servidores e apoiadores da causa. O desembargador Glauber Rêgo chamou atenção para o significado do projeto: “Cada página escrita dentro de uma prisão é um grito de humanidade”. A juíza Sulamita Pacheco destacou que o prêmio confirma algo que o projeto já prova há anos: “A escrita abre portas para a reintegração, para o reencontro com a própria dignidade”.

No fim, o Innovare reconhece mais do que uma prática judicial. Reconhece um gesto cultural. Porque ali, no lugar onde a liberdade é o que menos existe, a literatura conseguiu criar uma fresta. Uma ponte. Um sopro de vida nova. E isso, convenhamos, já renderia um belíssimo livro.

LEIA AQUI: Conheça o projeto do TJRN que transforma detentos em escritores e é finalista do Prêmio Innovare 2025

*Ana Bezerra

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