As mortes no trânsito são a guerra que o Brasil está perdendo. Perde em vidas, perde na dor das famílias e no estrago nos bolsos dos envolvidos e dos cofres públicos: a Previdência sentiu o golpe. A conta está alta. Sem contar a perda de capacidade laboral de pessoas de 18 a 35 anos que deixa de existir. O Brasil, na contramão do mundo, registrou acréscimo na quantidade de acidentes fatais entre 2000 e 2007, ao contrário da tendência dos países desenvolvidos. Houve um aumento de 30% nas mortes. O pico histórico ocorreu em 2007, com 66.837 mortes.
Os últimos números oficiais do trânsito no Brasil, embora ainda não consolidados, datam de novembro de 2010, com aproximadamente 43 mil mortos naquele ano. Um número de vítimas digno de uma guerra sangrenta, destas que duram vários anos. Só para ter uma ideia, durante os 16 anos em que estiveram envolvidos na Guerra do Vietnã os americanos registraram 58.220 mortos. Nos três anos da Guerra da Coréia, entre 1950 e 1953, o número de vítimas fatais americanas foi de 36.516.
O advogado e professor Luiz Flávio Gomes vê um quadro exatamente oposto no Brasil. “Um desastre. Ou seja, tragédias anunciadas”, diz ele. Para estas tragédias contribuem uma série de fatores, enumerados pelo jurista: aumento diário da frota, motoristas mal treinados, motociclistas e pedestres desrespeitados, motociclistas irresponsáveis, arrogância no volante, atraso cultural, falta de educação, vias públicas mal sinalizadas e esburacadas, falta de estradas modernas, carteiras de motoristas compradas, falta de segurança nos veículos, péssima estrutura de atendimento nos primeiros socorros, precária fiscalização, abuso do álcool, excesso de velocidade, rachas urbanos e impunidade generalizada. Com esta farta convergência de fatores, Gomes diz que a consequência é uma só: “Ir contabilizando os cadáveres e os entes queridos perdidos, porque de uma política nacional de prevenção de acidentes ninguém, seriamente, fala nada”.
A maior taxa de mortalidade entre os estados brasileiros é de Santa Catarina, com 33,1 mortos no trânsito para cada 100 mil habitantes, de acordo com último levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios. Mato Grosso do Sul (30,4) e Paraná (29,8) também ostentam taxas consideradas muito altas levando em conta suas populações. Um detalhe: a maioria das vítimas fatais do trânsito no Brasil continua sendo homens jovens de cidades de pequeno e médio porte.
Ninguém aguenta mais
O advogado e especialista Marcelo Araújo, que ocupa atualmente a Secretaria de Trânsito da cidade de Curitiba, diz que estes acidentes impõem um custo elevado para o País. E como se fosse realmente uma guerra, as principais vítimas são homens jovens, com idade entre 18 e 35 anos, que privam o País de uma capacidade laboral. Em seguida, também como numa guerra, há a dor para o núcleo familiar, irreparável e imensurável. Naturalmente, ainda como numa guerra, tem um elevado custo financeiro: seja para a família, que priva de alguém que reforça o orçamento e que se vê repentinamente com uma série de obrigações financeiras a cumprir em decorrência dos acidentes. Sobra até para os cofres públicos. A Previdência já chiou: não aguenta mais este custo adicional elevado.
Sem contar, ainda, que estes crimes sobrecarregam de trabalho o Poder Judiciário com a elevação do número de ações cíveis e criminais. “E quem paga isto é o povo”, diz Araújo. De qualquer maneira é um ônus e sobrecarga para os tribunais. Araújo diz que o sujeito que mata alguém no trânsito é um de criminoso peculiar, porque na maioria dos casos ele não premedita. “Ninguém sai de casa pensando em matar ou em ser morto no trânsito. Se eu não queria o resultado, onde está a culpa?”, indaga ele. Ele especula que “é uma incoerência acontecer tantas coisas trágicas sem querer”. Mas, o diacho, é que acontece. E acontece demais. É preciso um basta.
Se milhares de pessoas morrem, se os causadores dos acidentes (que não morrem) alegam que não queriam matar e muitos outros continuam matando, por que a carnificina brasileira não tem fim? A resposta, segundo o psicólogo Juliano Ienkot, é a impunidade. Enquanto houver impunidade, os cadáveres vão se amontoando nas ruas e nas estradas do País. Doze anos atuando na educação de trânsito, para prevenir contra direção agressiva e direção imprudente, Ienkot acumulou experiência suficiente para dizer que “a lei é muito branda. Tem muitas brechas. Quem mata no trânsito não tem punição adequada. Ele se sente protegido”. Um exemplo está no teste do bafômetro. “A pessoa dirige. Está bêbada. Ela não é obrigada a fazer o teste de bafômetro, porque a legislação brasileira impede que a pessoa produza provas contra ela mesma. Como esse caso do deputado. O caso do filho do Bibinho. Estava comprovado. Alta velocidade. Grande quantidade de álcool no sangue. Estas pessoas abusam porque não são punidas”, diz ele.
O psicólogo compara a nossa realidade com a de outros países: “Nos Estados Unidos e na Europa, se a pessoa dirige bêbada ela vai presa. Na Inglaterra, se você é um milionário, você vai pagar uma multa de trânsito mais pesada, você paga de acordo com a sua capacidade financeira. Aqui não, aqui as pessoas agem como estivessem enfrentando o Estado. Como estivessem provocando para ver o que acontece. E acontece isso. Mortes no trânsito”.
O advogado Marcelo Araújo bate a mesma tecla: “É preciso acontecer com o álcool o mesmo que aconteceu com o cigarro. Ninguém aceitar. Em 1960 era possível ver James Dean com um cigarro na boca ao lado de seu Porsche. Algumas situações culturais foram mudando. Mudar a lei é fácil. Mudar o comportamento e a consciência é mais complicado”, diz ele. “É melhor aprender com amor do que aprender com a dor”, ensina Araújo.
Paraná Online
Os últimos números oficiais do trânsito no Brasil, embora ainda não consolidados, datam de novembro de 2010, com aproximadamente 43 mil mortos naquele ano. Um número de vítimas digno de uma guerra sangrenta, destas que duram vários anos. Só para ter uma ideia, durante os 16 anos em que estiveram envolvidos na Guerra do Vietnã os americanos registraram 58.220 mortos. Nos três anos da Guerra da Coréia, entre 1950 e 1953, o número de vítimas fatais americanas foi de 36.516.
O advogado e professor Luiz Flávio Gomes vê um quadro exatamente oposto no Brasil. “Um desastre. Ou seja, tragédias anunciadas”, diz ele. Para estas tragédias contribuem uma série de fatores, enumerados pelo jurista: aumento diário da frota, motoristas mal treinados, motociclistas e pedestres desrespeitados, motociclistas irresponsáveis, arrogância no volante, atraso cultural, falta de educação, vias públicas mal sinalizadas e esburacadas, falta de estradas modernas, carteiras de motoristas compradas, falta de segurança nos veículos, péssima estrutura de atendimento nos primeiros socorros, precária fiscalização, abuso do álcool, excesso de velocidade, rachas urbanos e impunidade generalizada. Com esta farta convergência de fatores, Gomes diz que a consequência é uma só: “Ir contabilizando os cadáveres e os entes queridos perdidos, porque de uma política nacional de prevenção de acidentes ninguém, seriamente, fala nada”.
A maior taxa de mortalidade entre os estados brasileiros é de Santa Catarina, com 33,1 mortos no trânsito para cada 100 mil habitantes, de acordo com último levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios. Mato Grosso do Sul (30,4) e Paraná (29,8) também ostentam taxas consideradas muito altas levando em conta suas populações. Um detalhe: a maioria das vítimas fatais do trânsito no Brasil continua sendo homens jovens de cidades de pequeno e médio porte.
Ninguém aguenta mais
O advogado e especialista Marcelo Araújo, que ocupa atualmente a Secretaria de Trânsito da cidade de Curitiba, diz que estes acidentes impõem um custo elevado para o País. E como se fosse realmente uma guerra, as principais vítimas são homens jovens, com idade entre 18 e 35 anos, que privam o País de uma capacidade laboral. Em seguida, também como numa guerra, há a dor para o núcleo familiar, irreparável e imensurável. Naturalmente, ainda como numa guerra, tem um elevado custo financeiro: seja para a família, que priva de alguém que reforça o orçamento e que se vê repentinamente com uma série de obrigações financeiras a cumprir em decorrência dos acidentes. Sobra até para os cofres públicos. A Previdência já chiou: não aguenta mais este custo adicional elevado.
Sem contar, ainda, que estes crimes sobrecarregam de trabalho o Poder Judiciário com a elevação do número de ações cíveis e criminais. “E quem paga isto é o povo”, diz Araújo. De qualquer maneira é um ônus e sobrecarga para os tribunais. Araújo diz que o sujeito que mata alguém no trânsito é um de criminoso peculiar, porque na maioria dos casos ele não premedita. “Ninguém sai de casa pensando em matar ou em ser morto no trânsito. Se eu não queria o resultado, onde está a culpa?”, indaga ele. Ele especula que “é uma incoerência acontecer tantas coisas trágicas sem querer”. Mas, o diacho, é que acontece. E acontece demais. É preciso um basta.
Se milhares de pessoas morrem, se os causadores dos acidentes (que não morrem) alegam que não queriam matar e muitos outros continuam matando, por que a carnificina brasileira não tem fim? A resposta, segundo o psicólogo Juliano Ienkot, é a impunidade. Enquanto houver impunidade, os cadáveres vão se amontoando nas ruas e nas estradas do País. Doze anos atuando na educação de trânsito, para prevenir contra direção agressiva e direção imprudente, Ienkot acumulou experiência suficiente para dizer que “a lei é muito branda. Tem muitas brechas. Quem mata no trânsito não tem punição adequada. Ele se sente protegido”. Um exemplo está no teste do bafômetro. “A pessoa dirige. Está bêbada. Ela não é obrigada a fazer o teste de bafômetro, porque a legislação brasileira impede que a pessoa produza provas contra ela mesma. Como esse caso do deputado. O caso do filho do Bibinho. Estava comprovado. Alta velocidade. Grande quantidade de álcool no sangue. Estas pessoas abusam porque não são punidas”, diz ele.
O psicólogo compara a nossa realidade com a de outros países: “Nos Estados Unidos e na Europa, se a pessoa dirige bêbada ela vai presa. Na Inglaterra, se você é um milionário, você vai pagar uma multa de trânsito mais pesada, você paga de acordo com a sua capacidade financeira. Aqui não, aqui as pessoas agem como estivessem enfrentando o Estado. Como estivessem provocando para ver o que acontece. E acontece isso. Mortes no trânsito”.
O advogado Marcelo Araújo bate a mesma tecla: “É preciso acontecer com o álcool o mesmo que aconteceu com o cigarro. Ninguém aceitar. Em 1960 era possível ver James Dean com um cigarro na boca ao lado de seu Porsche. Algumas situações culturais foram mudando. Mudar a lei é fácil. Mudar o comportamento e a consciência é mais complicado”, diz ele. “É melhor aprender com amor do que aprender com a dor”, ensina Araújo.
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